Pegando na veia do racismo no Brasil
Postado por Luiz Weis em 24/11/2008 às 6:22:58 PM no Observatório da Imprensa.
Eis o trecho final:
É o especial da Folha de domingo sobre racismo: 16 páginas sem um único anúncio, atualizando a sua primeira grande incursão pelo problema – o caderno, publicado em 1995, chamado “Racismo Cordial”.
O de agora – “O Racismo Confrontado” – também se baseia numa pesquisa do Datafolha sobre as atitudes declaradas dos brasileiros a respeito das relações entre brancos e negros. Embora obviamente preparado antes, saiu três dias depois que a Câmara dos Deputados aprovou projeto de cotas para negros, pardos e indígenas que tenham feito o ensino médio em escola pública nas universidades federais brasileiras.
A primeira “notícia” da pesquisa é que caiu dramaticamente, de 11% para 3%, a proporção daqueles que assumem o seu preconceito em relação aos negros, enquanto permaneceu estável (na casa de 90%) o contingente dos que acham que o brasileiro têm preconceito de cor.
Foi como se tivessem dito: “Eu não, mas os outros sim.” Está claro que as pessoas ficaram mais inibidas em manifestar o seu preconceito. A hipocrisia, dizem os franceses, é a homenagem que o vício presta à virtude. Mais disfarçado, o preconceito se rende ao fato de que o racismo é inaceitável.
Também caíram consistentemente as porcentagens de concordância com frases racistas, do tipo “Negro bom é negro de alma branca” (de 47% para 26%) ou “As únicas coisas que os negros sabem fazer bem são música e esporte” (de 43% para 20%).
A outra importante revelação do levantamento é que desta vez só 37% dos entrevistados – ante 50% em 1995 – se declaram brancos. Os “pardos” aumentaram de 29% para 36%, os “pretos” continuam o que eram (12% na primeira pesquisa, 14% agora).
Mas o que é notável no caderno especial é o que a Folha fez a partir e além da pesquisa: as seis reportagens da rubrica “Retratos”, mais três artigos de estudiosos, mais uma entrevista pingue-pongue (com o ministro Joaquim Barbosa, o primeiro negro a chegar ao Supremo Tribunal Federal), mais a excelente série de seis breves depoimentos com experiências pessoais de racismo, em resposta à pergunta “Em que situações a cor da sua pele se mostra relevante?”
Do ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, por exemplo:
”Fui abordado [num vôo para o exterior] pela aeromoça brasileira em inglês e respondi que ela podia falar em português mesmo, porque eu era brasileiro. Um outro passageiro, já sentado, ouviu o diálogo e disse à moça que eu era ministro. Imediatamente, ela perguntou: ‘De qual igreja?’.”
Quase tão bom como o item da pesquisa que pedia aos entrevistados que atribuíssem uma cor a 11 “celebridades nacionais”.
Quarenta e quatro por cento disseram que Ronaldo era pardo. Comentário do jogador: “Eu, que sou branco, sofro com tamanha ignorância.” Quarenta e dois por cento disseram que Lula – branco por todos os critérios imagináveis – era pardo também. Assim como outro branco, Caetano Veloso (pardo para 40% dos entrevistados).
A reportagem a respeito cita o historiador Luiz Felipe de Alencastro. O seu argumento:
”Quando se pede para atribuir cores a celebridades, é óbvio que os entrevistados não responderam apenas sobre a pigmentação da pele. Compõem as respostas critérios de qualificação intelectual, os papéis que a pessoa desempenha na sociedade, como ela quer ser vista.”
Daí que o ex-presidente Fernando Henrique, que certa vez se declarou “mulatinho, com um pé na cozinha” foi dado como branco por 70%, e pardo, só por 17%.
O primeiro especial da Folha sobre racismo acabou sendo publicado como livro. É o que merece acontecer com este.
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Foi o Truda quem sugeriu. Que show, hein? A íntegra está aqui. Mas quem assina Folha/UOL tem que ler o especial O racismo confrontado.
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