terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Que venha logo essa Comissão da Verdade!

A entrevista é de outubro, foi publicada na Folha, a autora é a Cantanhêde, mas... nada é perfeito. As palavras do grande magistrado espanhol estão valendo mais do que nunca. (A dica é do Marco, o arquivo é do Nassif, a foto é do Guardian.)
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"Para virar a página, é preciso lê-la", afirma juiz sobre anistia

Baltasar Garzón diz que criar Comissão da Verdade é questão de tempo no Brasil. "Há sempre resistência [à revisão da lei], mas os acontecimentos e as cortes internacionais dão o impulso", avalia

Eliane Cantanhêde, Folha, 14/10/2010

Famoso internacionalmente depois de pedir a prisão do ditador chileno Augusto Pinochet por violação de direitos humanos, o juiz Baltasar Garzón diz que a revisão da Lei da Anistia, a criação da "Comissão da Verdade" para investigar crimes da ditadura militar e a abertura dos arquivos de torturas e desaparecimentos são uma questão de tempo no Brasil. "A discussão sobre a Lei da Anistia é algo que está vivo na sociedade brasileira", disse Garzón, que completa 56 anos no dia 26. "Para virar a página, é preciso lê-la antes."

Após 16 anos de FHC e Lula, o Brasil não avançou no debate sobre a revisão da Lei da Anistia. Por quê?

Baltasar Garzón - As leis de anistia não têm mais sentido hoje em dia. Há um consenso de juristas e democratas de que não se pode aceitar anistia para crimes contra a humanidade ou de tortura. Isso é polêmico aqui, até porque houve decisão do Supremo Tribunal Federal, mas a Corte Interamericana de Direitos Humanos nos ajudará a compreender em novembro onde estão os limites e que interpretação se dá hoje à anistia. Como isso acontecerá no fim do governo, Lula estará mais livre para liderar a revisão da Lei da Anistia? Lula tem sido muito atuante na defesa dos direitos humanos, o que é um grande ativo do Brasil no âmbito internacional. Nisso se inclui toda a rede de proteção social para que a pobreza mingue e haja mais igualdade social. Quanto à Lei de Anistia, imagino que vai depender da interpretação da lei, interna e internacionalmente.

O futuro presidente poderá avançar na questão da anistia, já que os dois candidatos combateram a ditadura?

A sociedade e o Judiciário é que têm de dar impulso maior para que o Legislativo crie a Comissão da Verdade para pôr a primeira pedra numa reconciliação nacional verdadeira. Alguns vão tentar dizer que a discussão está fechada e não interessa reabri-la. Não é verdade, tanto que se continua cobrando, discutindo. A discussão sobre a Lei da Anistia é algo vivo na sociedade.

Por que o Brasil foi a única democracia da região que não reviu a Lei da Anistia?

Como na Espanha... Mas devemos lembrar que todos os países optaram originalmente também por não reformar nem anular essas leis.

Mas no Brasil essa resistência não está durando demais?

Poderia ir mais rápido, sim, mas, se analisamos a média dos países, estamos falando de 15, 20 anos para mudar. Como a lei do Brasil é de 1979, é agora que está se produzindo essa reflexão.

Como sr. vê o argumento de setores de que a Lei da Anistia já é uma reconciliação e que se deve virar a página?

Para virar a página, é preciso lê-la antes. Para encerrar um capítulo e passar a outro, é preciso tê-lo lido. Se não for assim, sentiremos a falta de não ter lido a história direito e não compreenderemos os capítulos seguintes. A verdade não dói e, se dói, nunca deve ser ocultada. Será sempre melhor conhecê-la.

Um comentário:

Anônimo disse...

A frase dele é fantástica e sintetiza tudo.

Pagu

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