quarta-feira, 28 de julho de 2010

Santa e o progresso. Segundo o PiG

O conservadorismo se manifesta em tudo, até na escolha do modo de viver. Não é que a Veja-Rio se meteu a palpitar sobre o futuro de Santa Teresa, meu amado ex-bairro? Mairzinho Pena Neto escreve um texto candente -- se bem que educado demais para o meu gosto. Eu cairia de pau não apenas porque sou vítima da nova invasão francesa -- os franceses compraram velhos casarões de Santa e transformaram em hotéis de luxo, levando o preço dos imóveis a subir como foguete --, mas porque entre outros excessos ônibus gigantescos repletos de turistas esmagam as pedras antigas das ruas, fazem tremer as paredes centenárias, destroem um jeito calmo de se levar a vida. O bairro não comporta. Não comporta grandes hotéis, não comporta grande comèrcio. A não ser que mude. Mudando, expulsará seus moradores. E não será mais Santa.

A Veja, sempre na contramão, acha que os defensores do bairro "astravancam o pogresso". O PiG é definitivamente uma tragédia para o Brasil e para o povo brasileiro.

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Santa Teresa quer manter seu estilo de vida

Mair Pena Neto

Direto da Redação, 28/7/2010
Como diz o dito popular de que se você quer ser universal, fale de sua aldeia, volta e meia trato aqui de questões de Santa Teresa, um dos bairros mais charmosos do Rio de Janeiro, que escolhi para viver e cuja preservação defendo para que não perca suas características peculiares.

Santa Teresa é um lugar para se morar, apreciar e visitar e dele se lembrar como da primeira vez em que foi visto. Como centros antigos e cidades históricas, não admite muitas intervenções. Em seu caso, não só pelo tombamento como área de preservação ambiental, mas por uma maneira de viver, já muito deteriorada pelo crescimento das favelas no Rio de Janeiro.

O morador de Santa Teresa tem orgulho de seu bairro e luta por preservar suas características e sua tranqüilidade. Os espaços comerciais, hoje muito cobiçados, devem se manter restritos a determinados eixos e em quantidade limitada. Concessões não podem ser aceitas sob o risco de se destruir um lugar único.

É justamente esse debate que se trava agora em Santa Teresa por conta do surgimento de uma associação de empreendedores da região, que procura estimular a abertura de novos estabelecimentos para dinamizar o bairro e aumentar sua segurança. A postura da nova organização se chocou com a da tradicional Associação de Moradores de Santa Teresa (Amast), mais preocupada com a invasão de visitantes e o caos que pode criar no bairro, já atormentado por problemas com a estrutura comercial existente.


Não quero duvidar dos bons propósitos dos comerciantes, muitos deles moradores de Santa Teresa, e acho que um entendimento é possível desde que se criem limites para a expansão desejada. Mas a discussão não pode sair do seu eixo e sofrer manipulações como fez a revista Veja Rio ao tratar do assunto. Bem no seu estilo maniqueísta, Veja procurou desqualificar um dos lados, justamente o da associação de moradores, tachando sua postura de “ingenuidade romântica”. A revista afirma que a Amast quer “conservar o espírito dos anos 70, quando o êxodo de moradores mais abonados causou uma queda no preço do aluguel e atraiu para lá artistas e alternativos em geral, todos em busca de uma tranqüilidade cada vez mais rara em outras paragens.”

Em primeiro lugar, seria preciso perguntar à Veja que mal há nisso? Será um pecado gostar de uma vida tranqüila e lutar por ela? Certamente, a noção de progresso de Veja não leva em conta o bem estar das populações.

Veja é tendenciosa ao falar de um processo de decadência local e atribuí-lo à contenção da expansão do comércio. A matéria fala em redução dos postos de trabalho no bairro como se esse fosse um indicador de qualidade de vida. Santa Teresa é um bairro residencial e o comércio deveria ser o necessário para atender suas necessidades e atrair um determinado número de visitantes.

A revista defende a abertura de hotéis e restaurantes refinados e ignora que o bairro não conta mais sequer com uma padaria. Veja ainda relaciona os problemas históricos de segurança da área à existência de menos pontos comerciais, o que é absoluta inverdade. Santa Teresa enfrenta sérias questões de segurança, como praticamente todos os bairros do Rio de Janeiro, pela falta de um policiamento eficiente, e, no seu caso particular, por um descaso absurdo com a iluminação pública, que a revista citou como único ponto de identidade entre as duas associações.

Por suas características e dimensões, Santa Teresa é um lugar de moradia permanente, que se assemelha ao estilo europeu. As pessoas escolhem viver lá como opção de vida e não como investimento financeiro. Quem deixa o bairro, costuma estar atrás de mais comércio, bares, shoppings, garagens, complexos cinematográficos, um estilo mais norte-americano, que desvirtua o conceito de cidade, o que dizer de bairro.

Santa Teresa não quer, como diz Veja, “resistir ao progresso”. O que seus moradores desejam é preservar a urbanidade, que não se mede por população ou excesso de oferta, mas pela educação, cultura e maneira de viver.

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